Risonho, educado e cuidadoso, Shigeru Miyamoto (Kioto, 1952) não perdeu em seu olhar o brilho e a esperança daquele menino que sonhava em ser desenhista de mangá (história em quadrinhos japonesa) e que canalizou sua genialidade para o mundo dos videogames.
Depois de muitosprêmios e reconhecimentos internacionais, foi recentemente agraciado com o Prêmio Príncipe das Astúrias de Comunicação e Humanidades 2012, que foi entregue no dia 26 de outubro em Oviedo (Espanha).
Miyamoto mantém sua humildade, seu empenho pela recreação e pretende aproximar o mundo dos videogames cada vez mais com o conceito universal de cultura.
Ao sul da estação de trens de Kioto está o quartel-general da Nintendo, um enorme cubo branco, separado do exterior por muros que guardam em seu interior o segredo e a magia de Miyamoto.
Na entrada, os guardas de segurança rigorosamente uniformizados combinam simplicidade com uma decoraçãoinfantil da guarita, na qual prevalecem imagens e bonecos do ícone da casa, o gordinho e saltitante encanador Mario.
"Queria ser desenhista de mangá"
Através de uma porta na enorme entrada, minimalista, silenciosa e limpa, se chega a uma sala na qual Miyamoto, de aspecto jovial e vestido com uma jaqueta negra e camisa cinza com imagens de um Mario "pixelado", abre as portas da sua 'fábrica' enigmática.
"Apesar de ter participado do nascimento dos videogames, originariamente queria ser desenhista de mangá", revelaMiyamoto em uma entrevista exclusiva com a Efe, que considera seu trabalho na Nintendo como "uma ferramenta" para se expressar.
O diretor de desenvolvimento criativo da Nintendo acredita que o mais interessante dos videogames é a sua "natureza única de interação", uma singularidade que faz o usuário pensar e decidir.
"Nos videogames não podem ser repetidos os mesmos processos. Depende de cada pessoa, de cada situação", e isso permite que possam ser resolvidos "de formas muito diferentes", afirma.
Em suas criações, sua equipe na Nintendo prepara um número limitado de soluções e opções em cada jogo mas, "às vezes existem coisas que nem os criadores conseguem imaginar, o que gera um vínculo muito emocionante que une o criador com o usuário", comenta Miyamoto a Efe.
Da sua imaginação e grande habilidade nasceram mais de uma centena de jogos e personagens, embora, de todos eles, reconhece guardar um carinho especial por sua primeira criação, "Donkey Kong", um jogo de habilidade recreativa que, em 1981, apresentou o Super Marioao mundo eque mais tarde se tornou a imagem mais universal da empresa e sua principal franquia.
"Donkey Kong é especial para mim. Quando trabalhava nesse projeto pensava que se 'Donkey' fosse um sucesso, iria me dedicar aos videogames por toda a vida. Esse jogo determinou minha carreira", assegurou Miyamoto.
Para o artista, Mario ocupa um lugar prioritário em sua vida, já que esse personagem, "junto com o hardware da Nintendo, promoveu a difusãodos videogames no mundo".
Com mais de 200 milhões de jogos vendidos, as numerosas aventuras do Mario surgiram da imaginação privilegiada de Miyamoto, que desenhou o personagem em um momento no qual os jogos de videogame eram um trabalho para "os engenheiros, não para os artistas" e, dadas as limitações técnicas da época,era necessário dar um ar diferente.
"Tentei fazer um personagem diferente", diz, e pensou em um nariz grande e um bigode "para que as pessoas pudessem reconhecê-lo". Ao apresentar seu esboço a seus companheiros de trabalho na Nintendo, todos pensaram que o personagem parecia muito com um italiano, e disseram: "Vamos chamá-lo de Mario", lembra Miyamoto.
O encanador, vestido com seu habitual macacão de trabalho azul e seu boné vermelho, protagonizaria, em 1983, sua primeira aventura sozinho, "Mario Bros.", uma revolução para a época que, desde então, obteve um sucesso sem precedentes de crítica e vendas.
Miyamoto, às vezes criticado por fazer jogos para um público familiar e infantil, defende seu trabalho na indústria do entretenimento e se sente muito vinculado à filosofia da Nintendo, cuja missão, diz: "É fazer o maior número possível de pessoas no mundo sorrirem".
Para sua equipe, o importante é "não fazer só um jogo de videogame", mas superar a ideia que os jogos são só violência, aventuras e ação, alémde criar ferramentas e produtos inovadores que "mostrem às pessoas suas enormes possibilidades" para "gerar emoções" e atingir muito mais gente.
Com este objetivo, a Nintendo já produziu propostas inovadoras como o "Art Academy", um programa para desenvolver habilidades de pintura, o "Nintendogs & cats", com o qual a pessoa aprende a cuidar deum animal de estimação, e o "Wii fit", um programa de treino físico que já vendeu mais de 60 milhões de unidades.
"Nintendo é uma companhia que pensa em termos de mercado global" e seu objetivo é criar "algo acessível para o maior número de pessoas e oferecer entretenimento imediato", afirma Miyamoto, poucos dias antes da estreia da sua nova grande aposta, o console "Wii U", com o qual espera "conquistar" novamente os lares de todo o mundo.